De Perfis a Competências: A Nova Era do Recrutamento
O mercado de trabalho está a atravessar uma transformação estrutural. A escassez de talento, a velocidade da transformação digital e as novas expectativas das organizações e dos candidatos obrigam a rever os modelos tradicionais de recrutamento.
O paradigma centrado em diplomas, experiências passadas ou cargos anteriores está a dar lugar ao “skills-based hiring” — um modelo que valoriza competências, potencial, aprendizagem contínua e capacidade efetiva de fazer. Esta transição, longe de ser uma tendência passageira, representa uma mudança profunda e estratégica na forma como se identifica, atrai e retém talento.
Porque está o modelo tradicional a falhar?
Durante décadas, os processos de recrutamento foram baseados em critérios como o nome da universidade, o título do cargo anterior ou os anos de experiência. No entanto, estudos recentes demonstram que estes fatores são indicadores pouco fiáveis de desempenho futuro. Segundo o World Economic Forum, até 2027, mais de 50% dos trabalhadores terão de adquirir novas competências, dada a rapidez da automação e da evolução tecnológica.
A Harvard Business Review e a FreeOPP também destacam o fenómeno do “degree inflation”: muitas empresas continuam a exigir licenciaturas para funções que, historicamente, não o exigiam, limitando o acesso a talento qualificado. Este desalinhamento entre exigências e necessidades reais compromete a agilidade e a diversidade dos processos de recrutamento.

O que é o skills-based hiring?
O “skills-based hiring” é uma abordagem que coloca as competências no centro da decisão. Em vez de perguntar “onde estudou” ou “onde trabalhou”, os recrutadores querem saber “o que sabe fazer” e “como pode contribuir para os objetivos da organização”. Esta mudança traz benefícios evidentes:
- Aumento da diversidade e inclusão, ao remover barreiras como o diploma universitário;
- Redução do time-to-hire, ao focar diretamente nas competências exigidas;
- Melhoria da qualidade da contratação, ao alinhar o talento com os desafios concretos do cargo.
Avaliação psicométrica: um pilar invisível, mas crítico
Para tornar este modelo eficaz, é necessário avaliar as competências — técnicas e comportamentais — de forma objetiva. É aqui que entram as ferramentas psicométricas, os questionários de personalidade e as simulações reais de funções.
Através de testes de raciocínio lógico, verbal, numérico e de julgamento situacional (SJTs), é possível prever de forma mais fiável o desempenho no cargo do que com base apenas no CV. Segundo a TestGorilla, 88,8% das empresas que adotaram este tipo de avaliações consideram-nas mais eficazes do que a análise curricular tradicional.
Além disso, questionários de personalidade, como o Big Five, e testes de inteligência emocional ajudam a garantir um bom alinhamento entre o estilo de trabalho do candidato e a cultura da organização. Já dinâmicas de grupo, role plays ou business cases permitem observar diretamente comportamentos como liderança, tomada de decisão ou resolução de conflitos em contexto controlado — características frequentemente referidas como “intangíveis”, mas que podem e devem ser avaliadas com rigor.
Tendência emergente: “vibe coding” e AI-assisted recruiting
Uma tendência crescente em Silicon Valley é a valorização de competências em “vibe coding” — o uso de ferramentas de IA, como Cursor, Bolt ou Claude Code, para gerar código rapidamente (techcrunch.com businessinsider.com).
Empresas como Visa, Reddit, DoorDash e startups como Domu Technology passaram a exigir experiência em “vibe coding” nos seus anúncios de emprego, devido ao impacto na velocidade de desenvolvimento (até +40%). 🎯 Este movimento reforça a lógica do skills-based hiring, pois avalia competências concretas baseadas na capacidade de maximizar produtividade com ferramentas de IA, indo além das habilidades tradicionais.
Tecnologia aplicada à avaliação de competências
Segundo Maya Huber, CEO da TaTiO, “as empresas continuam a procurar candidatos com base em títulos e experiência porque não têm acesso a dados acionáveis sobre competências reais”. A proposta da TaTiO é precisamente colmatar essa lacuna, oferecendo simulações realistas de contexto de trabalho que permitem avaliar os candidatos com base nas tarefas que irão desempenhar — e não apenas no que dizem ser capazes de fazer.
Esta abordagem está alinhada com o que Huber defende como o futuro do recrutamento:

Na The Key Talent, a solução TaTiO é parte fundamental da nossa oferta de skills-based hiring, permitindo às empresas testar, de forma objetiva, as competências técnicas e comportamentais dos candidatos antes de avançar para fases mais dispendiosas do processo.
A importância da gestão de dados e da tecnologia
A transição para este modelo requer mais do que uma mudança de mindset. Exige uma gestão de dados robusta que permita mapear, medir e projetar competências de forma objetiva e comparável.

Além da TaTiO, plataformas como o AplyGo e o Teamtailor, também representadas pela The Key Talent, oferecem soluções integradas que permitem:
- Criar percursos de candidatura baseados em assessments de competências;
- Eliminar enviesamentos através de processos automatizados e objetivos;
- Fornecer dados analíticos sobre a compatibilidade entre candidatos e funções.
A ferramenta Panorama acrescenta ainda a capacidade de mapear o ecossistema de competências internas, apoiando planos de mobilidade e retenção.
Skills-based hiring na prática: tendências globais
Segundo um estudo da Deloitte, 73% dos líderes estão a fazer esforços para adotar práticas de recrutamento baseadas em competências. No entanto, apenas 5% dizem ter processos totalmente consolidados neste modelo, o que revela a complexidade da mudança.
Plataformas como a Indeed e a Glassdoor estão igualmente a adaptar-se, oferecendo ferramentas que ajudam os empregadores a avaliar competências e alinhar valores, e os candidatos a mostrarem aquilo que sabem efetivamente fazer.
Conclusão: uma oportunidade para transformar
A mudança para o skills-based hiring não é apenas uma resposta à escassez de talento — é uma oportunidade estratégica para criar equipas mais alinhadas, diversificadas e preparadas para o futuro. As organizações que liderarem esta transição vão destacar-se não apenas na atração de talento, mas na sua capacidade de o desenvolver, motivar e reter.
Na The Key Talent, acreditamos que esta mudança começa com tecnologia, mas ganha impacto com uma visão centrada nas pessoas. Porque mais importante do que o que está no CV, é o que cada pessoa tem para oferecer — e aprender.

Sobre o Autor
Miguel Luís
Marketing & Employer Branding Director @The Key Talent
Fundador da Comunidade Employer Branding Portugal
Com mais de 20 anos de experiência profissional nas áreas de Gestão de Pessoas (Recursos Humanos) e Marketing/Comunicação, sou o que gosto de designar de Ma(RH)keter.