Planear a Sucessão com Dados: o futuro da identificação de líderes
No seguimento da pertinente discussão levantada pelo meu colega Miguel sobre a importância da sucessão nas organizações, gostaria de voltar ao tema — mas olhando para além dos cargos de topo. Falar de sucessão não é apenas preparar o “próximo CEO”, é pensar no futuro das equipas, dos gestores intermédios e dos especialistas críticos que sustentam a execução diária e a continuidade do negócio.
E é precisamente aqui que os dados assumem um papel determinante. Segundo a Harvard Business Review (2023), 63% das empresas admitem não ter um plano de sucessão formal e, das que têm, a maioria baseia-se ainda em perceções subjetivas ou históricos de performance. O problema? A performance explica o passado — o assessment revela o futuro
Da performance ao potencial
Os planos de sucessão tradicionais centram-se em métricas de desempenho e recomendações das chefias. Esses indicadores, embora relevantes, captam apenas uma parte da equação. Como lembra a Aon (2024), as organizações mais preparadas para o futuro são aquelas que integram dados de performance com evidência científica sobre competências, estilo de liderança e capacidade de adaptação.
Este é o ponto em que a psicometria e a analítica avançada mudam as regras do jogo. Os assessments permitem medir dimensões como agilidade, orientação para resultados, influência, tomada de decisão e motivação, oferecendo uma perspetiva objetiva e comparável sobre o potencial. Quando cruzados com os resultados de performance, revelam quem tem as competências certas para o próximo desafio, e não apenas quem teve sucesso no modelo atual.
Em vez de olhar apenas para o que os colaboradores já alcançaram, a organização passa a compreender como cada pessoa poderá responder ao contexto futuro — um passo decisivo para identificar talento de alto potencial em todos os níveis hierárquicos.
A ciência por detrás do assessment
A força dos dados de assessment está na sua capacidade de transformar informação dispersa em conhecimento acionável. A metodologia que temos vindo a aplicar em programas de gestão de talento assenta em dois eixos complementares: o Análise de Componentes Principais (ACP) e a Análise de Clusters. O ACP reduz a complexidade das variáveis avaliadas, identificando os fatores que melhor explicam o sucesso nos diferentes papéis de liderança. Assim, é possível construir um perfil normativo de competências — ou seja, o padrão que distingue os profissionais de alto desempenho em determinado contexto.
Já a Análise de Clusters agrupa indivíduos com características semelhantes, revelando perfis de talento distintos, como líderes mais mobilizadores, estratégicos ou relacionais. Este tipo de análise permite ir além do ranking individual e compreender como diferentes estilos de liderança contribuem para o equilíbrio global da organização.
Segundo a Deloitte (2024), as empresas que utilizam dados psicométricos e de clusterização em processos de sucessão aumentam em 32% a precisão das suas decisões. Mais do que uma fotografia estática, o modelo cria um mapa de talento dinâmico, permitindo visualizar onde está o potencial e como desenvolvê-lo.
Integrar dados de performance, potencial e contexto
A verdadeira transformação surge quando a análise de dados vai além do diagnóstico e passa a ser um instrumento de decisão estratégica. Nos projetos mais recentes, a integração entre dados de performance real, contexto operacional e motivação individual permitiu evoluir de relatórios descritivos para modelos preditivos — capazes de indicar quem está preparado para liderar agora, quem pode estar pronto a médio prazo e que tipo de desenvolvimento é necessário para chegar lá.
A combinação de variáveis objetivas (como resultados comerciais ou operacionais) com fatores comportamentais (como liderança mobilizadora, agilidade cognitiva ou orientação para o cliente) permite alinhar os perfis de talento com os desafios do negócio. Como destaca a Gartner (2024), esta convergência entre analytics e gestão de talento transforma a sucessão num processo contínuo, adaptativo e centrado em evidência, e não num exercício anual de substituição de nomes.
Desta forma, a sucessão deixa de ser um exercício reativo — que responde a saídas inesperadas — e passa a ser um processo vivo, alimentado por dados que evoluem com a organização.
Um novo paradigma de liderança
Planear a sucessão com base em dados não é substituir a intuição, mas complementá-la com rigor. As organizações que adotam metodologias analíticas estão a descobrir que o verdadeiro sucesso não está em encontrar o próximo líder igual ao atual, mas em construir ecossistemas de liderança diversos, complementares e sustentáveis.
A análise de clusters, por exemplo, tem revelado três tipos de perfis frequentemente presentes nas equipas de gestão: Mobilizadores de Resultados, Estratégicos Adaptativos e Relacionais Estabilizadores. Cada um destes perfis tem um papel essencial no equilíbrio organizacional. O segredo está em reconhecer e desenvolver cada estilo, ajustando estratégias de sucessão, desenvolvimento e rotação de funções para assegurar continuidade e inovação simultaneamente.
Como conclui a Harvard Business Review (2023), o planeamento de sucessão não é sobre substituir pessoas — é sobre sustentar o propósito e o futuro da organização. E o futuro, como os dados mostram, pertence às empresas que conseguem alinhar performance, potencial e cultura, transformando a sucessão num processo contínuo de descoberta e desenvolvimento de talento.
Referências
Aon (2024). A better approach to succession planning using assessment data.
The Key Talent (2024). Psicometria e Sucessão nas Organizações.
Harvard Business Review (2023). The Leader’s Guide to Succession Planning.
Deloitte (2024). Global Human Capital Trends 2024.
Gartner (2024). Succession Planning in the Age of AI and Data.
Dados internos da The Key Talent (2023–2025). Modelos de análise de competências, ACP e clusterização aplicados em organizações do setor financeiro e dos serviços.
Sobre o Autor
Hugo Bernardes
Managing Partner at The Key Talent Portugal
Consultor e gestor de RH com mais de 20 anos de experiência em aquisição de talentos, desenvolvimento e liderança.
É co-fundador da The Key Talent.
Desenvolvimento de Software e serviços de avaliação inovadores para RH.