Digitalizar a entrevista não é fazer uma entrevista em vídeo
Todos nós vimos como a pandemia acelerou a digitalização dos processos de gestão de pessoas. As empresas, principalmente os departamentos de Recursos Humanos, têm feito um grande esforço para digitalizar os processos de seleção, desenvolvimento e identificação de talento.
Nestes três processos (seleção, desenvolvimento e identificação de talento), a entrevista desempenha um papel importante. Além de ser a técnica mais amplamente utilizada para identificar e avaliar competências, é também a mais preditiva.[1] Quando pensamos numa entrevista de emprego ou avaliação, surge-nos espontaneamente à mente o tempo de interação com o candidato . Desse ponto de vista, a digitalização da entrevista poderia ser entendida simplesmente como fazendo-a virtualmente por Teams, Zoom ou qualquer outro sistema. E é assim que muitas empresas o entendem.
[1] Salgado y Moscoso (1995); Salgado, Viswesvaran y Ones (2001)
Porém, a entrevista é muito mais, não é apenas uma técnica, é também um processo. O que diferencia uma entrevista verdadeiramente preditiva de passar tempo a conversar com um candidato, é exatamente o que acontece antes e depois dela. A chave do sucesso é a preparação. Em que consiste especificamente esta preparação?
- Definir as variáveis a serem avaliadas na entrevista: Idealmente, não mais do que seis para uma entrevista de uma hora, onde também queremos conhecer a carreira profissional do candidato. Para cada variável, devemos ter uma breve definição e os comportamentos associados identificados.
- Guião de entrevista estruturado: Normalmente, participam diferentes pessoas num processo de seleção ou avaliação. É crítico partilhar um consenso sobre o que são as melhores perguntas para explorar as competências a avaliar, seria muito injusto que um candidato tivesse sido avaliado de forma diferente do outro, apenas porque lhes foram colocadas questões diferentes e um deles tenha sido capaz de explanar melhor ou pior do que outro as competências em análise. As perguntas devem seguir uma metodologia de incidentes críticos.
- Guia de avaliação com âncoras comportamentais: Da mesma forma que é necessário elaborar um guião da entrevista, é fundamental que a guião de avaliação seja acordado previamente. Na prática esta guião de avaliação traduz em pontuações os comportamentos que o candidato conseguiu descrever na entrevista. A procura pela justiça e homogeneidade no processo de avaliação, independentemente do avaliador torna necessário a definição previa deste guião de avaliação.
Com essas informações preparadas, devemos desenvolver a avaliação durante a entrevista em três etapas:
- Observação e registo: Durante a entrevista devemos recolher o máximo de informações possível do candidato, sem nos preocuparmos, por enquanto, com a avaliação.
- Classificação: Depois da entrevista podemos depurar notas e comparar a respostas com o guião de avaliação.
- Classificação: Com base nos comportamentos registados e comparando-os com o guião de avaliação, atribuir a pontuação atingida.
Uma vez que estas etapas estejam concluídas, se necessário, realizar o relatório da entrevista.
O fato é que podemos ter o guião da entrevista em papel, o guião de avaliação em Excel, fazer anotações em caderno e fazer relatórios em documento Word, e sim, a entrevista por videoconferência.
Se pensarmos bem, que a entrevista seja feita por videoconferência, na verdade é o mínimo. Digitalizar a entrevista significa ter uma plataforma que permita automatizar todo o processo antes e depois, independentemente de ser realizado pessoalmente ou por videoconferência.
Refiro-me a trabalhar com uma plataforma ou ambiente onde possa antes da entrevista:
- Fazer upload do modelo de competências.
- Associar as perguntas da entrevista a cada competência e tenha à disposição um catálogo de perguntas que possa escolher em cada projeto.
- Definir um guião de avaliação.
E durante e após a entrevista:
- Gravar notas de entrevista.
- Associar notas a competências.
- Avaliar no guião de avaliação.
- Gerar automaticamente um relatório onde os resultados são exibidos de forma gráfica e narrativa.
O mais interessante sobre estas plataformas é a gestão de dados. Trabalhando num ambiente unificado, além de gerar um relatório de forma mais rápida e fácil , é possível comparar os resultados dos diversos candidatos, classificar e tomar decisões de forma mais ágil e segura. Além disso , existem atualmente plataformas como o Panorama onde é também é possível integrar os resultados de várias entrevistas, business cases , dinâmicas de grupo e até testes psicométricos objetivos, para ter uma fotografia completa de cada candidato e fazer comparações automáticas.
É interessante notar que numa entrevista convertemos informações qualitativas (os comportamentos que um candidato transmite) em informações quantitativas (pontuação numa competência). Obviamente, a informação qualitativa não é perdida, mas ter um ambiente digital onde os dados de avaliação quantitativos podem ser geridos, em última análise, permite trabalhar com metodologias de RH Analytics. Essas análises podem ajudar a identificar quais as competências que melhor podem prever o desempenho futuro e criar perfis de referência.
Portanto, a digitalização da entrevista não está verdadeiramente relacionada com o facto de a entrevista ser presencial ou remota, tem a ver com a automação do processo e gestão dos dados.